Dia de Camões

Não podiamos deixar de recordar Luís de Camões nesta edição de Junho e nada melhor do que apresentarmos excertos do discurso proferido, no dia 10 de Junho de 1968, junto à Gruta de Camões, em Macau, pela nossa colega e amiga Isabel Machado, em representação do Liceu Nacional Infante D. Henrique.

“.... Tratando-se de uma personalidade como a de Camões tão rica na vida interior como na obra por que se exprime e nos legou, nunca será demais debruçarmo-nos sobre ela para melhor a estudarmos e interpretar.

Todos sabemos que Coimbra e Lisboa disputam entre si a honra de terem servido de berço a Luís de Camões. Em que dia? Em que ano? Presume-se que entre 1524 e 1525, mas de concreto nada há quanto ao local e à data do seu nascimento. É esta a primeira incógnita na vida do Príncipe dos Poetas.
Foram seus pais Simão Vaz de Camões e Ana de Sá Macedo. A família de Camões descende de fidalgos galegos e fixou-se em Portugal cerca de 1370.

Camões perdeu a sua mãe, de tenra idade e desde pequenino começou a sofrer maus tratos duma hedionda madrasta. Quem sabe se não foi essa “vil megera” – como ele próprio mais tarde a designa – a causadora da índole insubmissa, do feitio rebelde, do génio indomável mas também da personalidade vincadíssima do nosso primeiro Épico, cujo apodo era o de “Trinca-Fortes” e que tão cedo começou a conhecer as inclemências do destino?

Sobre os seus estudos, concretamente, também pouco se sabe. Nova incógnita na Vida do Poeta ... Julga-se que frequentou cursos em Coimbra onde teria residido até 1542. São tão profundos os conhecimentos que patenteia na sua vasta obra que é difícil atribuí-los a autodidactismo. Estudou de certo na Velha Universidade, da qual seu tio Bento de Camões prior de Santa Cruz era Cancelário.

Coimbra, terra dos seus primeiros amores, das suas Canções, dos olhos verdes e cabelos louros da sua linda prima Isabel Tavares! Coimbra, onde viveu contente e “em paz com sua guerra” ! ...

De ascendência nobre, Camões foi cedo para a Corte de Lisboa mas também aí a sua vida continua envolta nas brumas do mistério.

Teriam sido certas alusões do Auto de El-Rei Selenco condenando veladamente o terceiro casamento do monarca com a noiva destinada a seu filho D. João, ou sua paixão platónica pela formosa Infanta D. Maria, mui erudita e intelectual filha de D. Manuel, as causas que motivaram o seu desterro para Constança? Pouco se sabe ao certo, a não ser que esta paixão sem esperança pela “Ilustre Senhora” deu azo a que Camões escrevesse sonetos maravilhosos ...
Pouco se demora no desterro. Daí parte para Ceuta onde luta heroicamente e perde, numa refrega com os Árabes, o olho direito.

A desgraça também aí o persegue. A saudade dilacera-lhe a alma. O amor mortifica-lhe o coração...


De regresso a Lisboa envolve-se em várias rixas, fere com gravidade um certo Moço da Corte Gonçalo Borges, é preso e só a “Carta de Perdão” de El-Rei D. João III o livra do cárcere mediante o compromisso de Camões “de ir servir para a Índia”. Uma vez em Goa sofre novas decepções porque só lá encontra incompreensão e cobiça desenfreada.

Continua a escrever em todos os géneros poéticos. Leva “numa mão sempre a espada e noutra a pena”.

Após a representação de sua peça “Filodemo” – escrita para as festas de investidura no cargo de Governador de Goa de Francisco Barreto – por causa de certas alusões da obra, crê-se que foi despachado para Macau com a triste função de “Provedor-Mor dos Defuntos e Ausentes”. E aqui, nesta terra que pisamos, neste local sagrado, rezam as crónicas – ou conta-nos a lenda - Camões compôs os sete primeiros cantos do seu glorioso e imortal Poema...
Não cessa de escrever. Poesia da estirpe de Virgílio soube como ele equilibrar no mesmo alto nível o pensamento, a imaginação, a emotividade, tudo caldeando com a sua extraordinária cultura, inteligência e espírito crítico. Daí resultou uma Obra Genial da maior dimensão que ultrapassou todos os limites da moda, da época, de escola e até da própria Nação.

Em 1559 regressa a Goa e naufraga no Rio Mekong, salvando a nado os “Lusíadas”... Nesse naufrágio sofre a dor suprema de perder a sua “ Tin-Nam-Men” uma doce e linda chinesinha que “em seu canto sempre seria celebrada”...

Em 1567 o Cronista Diogo Couto, passando por Lourenço Marques encontra-o “comendo de amigos e retocando os seus “Lusíadas”. Cinco anos mais tarde, já em Lisboa consegue publicar a sua Obra-Prima e EL-Rei D. Sebastião, a quem dedicou o Poema, concedeu-lhe uma tença de quinze mil reis. Fraca tença para tão forte Génio!...

... Expirou a 10 de Junho de 1580, miseravelmente, sem qualquer assistência! Os seus restos mortais, envoltos apenas num grosseiro lençol foram sepultados na Vala Comum à porta do Mosteiro de Santa Ana, em Lisboa...”

3 comentários:

Isabel disse...

No dia de Camões junto à gruta, onde era lido o discurso, chovia a potes! Nunca esquecerei esse dia, pois parecia de propósito e todos os anos caía muita chuva nessa época... Bons tempos os de estudante.

Ju disse...

Ainda me lembro na nossa figura junto à gruta onde iamos prestar a nossa homenagem ao poeta. A chuva torrencial não faltava nunca, pelo menos durante as celebrações.

GinaB disse...

Boas recordações apesar da chuva. Macau sã assi :)